Falar no 25 de Abril é falar do que se sentia nas Províncias Ultramarinas por parte de militares, muitos milicianos, que nelas prestavam serviço, bem como das suas famílias. A situação na Guiné-Bissau teve especial relevância, dado ter como Governador o General António de Spínola, autor de “Portugal e o Futuro”, obra que muitos, talvez, quase todos, consideram o despertar de consciências e de incremento ao processo que culminou com a Revolução de Abril. Muitas têm sido as publicações que pretendem retratar o Portugal de 1974, mesmo, nas Províncias de Guiné-Bissau, Angola e Moçambique. É esse o caso da situação vivida na Guiné-Bissau, por Natália Cardoso, nos anos de 1972/1973, professora na Escola de Bissau e, posteriormente, professora na Escola de Santa Maria do Olival.
Cidade de Tomar – Qual o ambiente, social, político e militar na Guiné-Bissau nos anos de 1972/1974 (ou outros) em que lecionou naquela província, hoje País independente?
Natália Cardoso – O ambiente a nível social era bom. Durante o tempo que vivi em Bissau, quase dois anos letivos, constatei sempre que havia um bom relacionamento, solidariedade, convivência e descontração entre todas as pessoas. Os Guineenses gostavam de nós. A nível político, como eu não percebia nada de política, nem sequer tinha ideias. A nível militar, sendo eu na altura casada com um militar, eram poucas as conversas ou nenhumas sobre esse tema. Embora, eu muitas vezes questionasse para com os meus botões, o porquê daquela guerra estúpida e sobre as notícias horríveis que todos os dias nos chegavam.

– E, como sentia a Comunidade Portuguesa com o evoluir da situação de guerra e o mandato do General António Spínola?
– A comunidade portuguesa em Bissau era restrita, eram familiares dos militares e alguns comerciantes que se encontravam lá há alguns anos. Em relação ao Sr. General Spínola tive o privilégio de ter dois encontros presenciais com ele e a sua esposa, Sr.ª D. Maria Helena, no palácio de Bissau pelo facto de eu ser professora.
– Da sua reflexão sobre o evoluir da situação, qual o sentimento local, caso o tenha havido, com a publicação do livro de António de Spínola?
– Sim, tive conhecimento desse livro. Mas, atendendo ao facto de eu estar envolvida como professora, era difícil aperceber-me de comentários. Possivelmente só nos meios militares e nos quartéis é que se comentaria esse livro. Aliás, na escola entre os elementos do corpo docente, que também existiam professores Guineenses, nunca havia qualquer tipo de comentários sobre a situação do País.
Sabemos, pela leitura do seu livro Geometria Descritiva de Saltos Altos, que foi professora, em Bissau, nos anos de 1972/10974. Qual o sentimento dos seus alunos para com a comunidade portuguesa?
– Os alunos gostavam muito das professoras da “Metrópole”. Eles percebiam que através de nós, tinham acesso a novos materiais, novos equipamentos, livros e ferramentas de trabalho diferentes. E na minha área, nos meus livros de Desenho com cores, era bem visível o entusiasmo e a curiosidade com todo esse material. (…)
Entrevista na íntegra na edição impressa de 26 de abril de 2024.